24.4.07

A mordomia Cristã expressa através do dízimo

Introdução ao tema

Falar de dízimo faz com que muitos cristãos pensem ou na exploração que se vê nos dias de hoje, ou na frase “dízimo é coisa do Antigo Testamento”.

Os pastores mais cuidadosos com a qualidade do Rebanho sofrem um dilema muito grande: Por um lado sabem que uma das maiores bênçãos para a vida cristã é o exercício espiritual que o dízimo proporciona, por outro lado, envergonhados do que se faz com o Evangelho (embora não se envergonhem dele), receiam falar constantemente deste assunto.

Vivemos o cumprimento da profecia, “farão comércio de vós”. Você já se deu conta qual é a mercadoria vendida?

É com temor e tremor, portanto, que, atendendo à decisão do Conselho de nossa Igreja, apresento essas lições para nossa Escola Dominical, contando desde já com suas orações.


Introdução a esta primeira lição
Ao longo da história a Igreja tem se utilizado das mais diversas formas de prover os recursos de que necessita para realizar sua missão.

Vemos claramente descrito em Atos o modo pelo qual a Igreja de Jerusalém encontrou para fazer frente as despesas que 8 mil pessoas trouxeram em questão de poucos dias após o dia de pentecostes: cada um vendia suas posses e colocava aos pés dos apóstolos. Se despatrimonializaram em tão pouco tempo que houve necessidade de Paulo fazer coletas entre as Igrejas gentílicas em prol deles.

Quando o imperador Constantino a declarou igreja oficial do Império Romano, todos os bens dos tempos pagãos foram confiscados e entregues a ela.

Seus líderes logo se viram em uma situação inusitada: deixaram de ser perseguidos e, ainda por cima, ganharam uma fortuna incalculável em terras, edifícios, tesouros e outras coisas mais. É claro que, os que trataram de ficar mais próximos de Constantino, ou os mais bem relacionados dentro de sua corte, como também os que detinham uma posição, seja geográfica ou politicamente, mais estratégica, receberam maior quinhão. O que dizer daqueles que tiveram capacidade de mobilizar mais rapidamente tropas em auxílio do exército do imperador?

O modo de financiamento das despesas da Igreja na época de Constantino era, portanto, a busca de dinheiro do estado (o que, de certa forma ainda perdura na mente de muitos cristãos) ou, a administração do que haviam recebido por patrimônio, através de arrendamento de terras.

Esse sistema perdurou até a Reforma Protestante do Séc. XVI, e, de certa forma, ainda pode ser encontrado naquelas Igrejas que possuem propriedades (sistema muito comum na Igreja de Roma).

Porém, em nenhum destes séculos a prática do dízimo foi completamente abandonada. Entretanto ele era sempre visto como um “imposto” a que a Igreja tinha direito e era cobrado mais dos governos do que das pessoas.

Com a Reforma Protestante houve divergências a respeito de como levantar os recursos. Nunca foi questionado, nem mesmo pela Reforma, a prática das ofertas voluntárias. Pelo contrário, para muitos era o método de contribuição mais adequado à Igreja.

Porém as Igrejas que aderiam a reforma, geralmente ficavam sem os bens, além do templo, que lhe garantiam recursos, e surgiram outras práticas, como a de rateio de despesas ou de aluguéis de bancos para as famílias daquela igreja local.

Eu mesmo, já convivi, há 10 anos atrás, quando licenciado para fazer o mestrado, em uma Igreja que rateava o orçamento anual, entre as famílias, conforme a capacidade financeira de cada uma.
Em algumas nações em que as Igrejas Reformadas são a “religião oficial”, até hoje, seus cidadãos, ao declararem seus “impostos de renda” especificam para onde o governo deve remeter os 10% daquilo que têm a pagar.


1. O homem é um mordomo
Provavelmente tenhamos que nos desfazer da imagem do mordomo que a literatura e os filmes colocaram em nossa cabeça. Nada mais distante do que é ensinado pela palavra de Deus.
A única analogia, que provavelmente possa ser feita, é a de que o dono da casa entrega a seu mordomo o valor necessário para que tudo, desde a compra de talheres até a contratação de funcionários, seja feita por ele. Ou seja: o mordomo administra a casa de seu senhor de modo a não lhe trazer aborrecimentos.

Fomos criados para ser mordomos de Deus. Sob nossa responsabilidade Deus colocou tudo o que fez. Veja Gn 1.26a30 e Gn 2.7a25.

Neste texto recebemos três funções básicas a que os teólogos chamam de “mandatos”:

Espiritual:
- “à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou” - Gn 1.27
- “Então, formou o SENHOR Deus ao homem do pó da terra e lhe soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente” - Gn 2.7


Social:
- “e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos”
- “Então, o SENHOR Deus fez cair pesado sono sobre o homem, e este adormeceu; tomou uma das suas costelas e fechou o lugar com carne. E a costela que o SENHOR Deus tomara ao homem, transformou-a numa mulher e lha trouxe. E disse o homem: Esta, afinal, é osso dos meus ossos e carne da minha carne; chamar-se-á varoa, porquanto do varão foi tomada. Por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne” - Gn 2.21a24

Cultural:
- “enchei a terra e sujeitai-a dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra.”
- “E plantou o SENHOR Deus um jardim no Éden, na direção do Oriente, e pôs nele o homem que havia formado. Do solo fez o SENHOR Deus brotar toda sorte de árvores agradáveis à vista e boas para alimento; e também a árvore da vida no meio do jardim e a árvore do conhecimento do bem e do mal. E saía um rio do Éden para regar o jardim e dali se dividia, repartindo-se em quatro braços. O primeiro chama-se Pisom; é o que rodeia a terra de Havilá, onde há ouro. O ouro dessa terra é bom; também se encontram lá o bdélio e a pedra de ônix. O segundo rio chama-se Giom; é o que circunda a terra de Cuxe. O nome do terceiro rio é Tigre; é o que corre pelo oriente da Assíria. E o quarto é o Eufrates. Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar.”


Observe:
- Do mandato espiritual derivava-se tudo, pois sendo o único a deter a “imagem de Deus” e compartilhar de “seu fôlego” - bela figura do Espírito Santo - o homem era o elo entre o restante da criação e o próprio Deus. Na linguagem teológica ele era seu regente.
- Do mandato social, derivava-se o relacionamento do homem com seu semelhante, a partir do núcleo de sua família: o relacionamento com a esposa. Ela lhe era idônea e tal relacionamento era sempre o núcleo de uma nova família que viesse a ser constituída.
- Do mandato cultural, deriva-se o relacionamento do homem com o meio-ambiente, e, fica clara que sua área de atuação não estava restrita, pois, apesar de falar de árvores, de mineração de ouro, de pedras preciosas, de cultivo e guarda (zelo), o jardim não deixa de ser do Senhor. O homem foi colocado nele para cuidar dele.


2. O homem continua a ser um mordomo
Apesar de ter sido afetado pelo pecado, e degradado os três mandatos que recebeu, Deus não retirou do homem suas incumbências originais.

A imagem de Deus foi deformada a tal ponto que dela sobrou aquilo que torna o homem diferente dos animais, comprometendo a execução do mandato espiritual. Somente pela Graça Comum (Graça de Deus que é comum a todos os homens, mediante a qual ele faz vir chuvas sobre bons e maus), e, especialmente, se for regenerado por Cristo esse mandato volta a ser exercido.

Se os outros dois mandatos dependiam desse, você pode calcular o quanto eles foram afetados. Aliás, é fácil de perceber isto: olhe para a sociedade e veja como o mandato social está sendo cumprido. Olhe para o ecossistema e veja como o mandato cultural está sendo cumprido.

O pecado atingiu o homem em seu relacionamento com Deus. Gn 3.8:
- “Quando ouviram a voz do SENHOR Deus, que andava no jardim pela viração do dia, esconderam-se da presença do SENHOR Deus, o homem e sua mulher, por entre as árvores do jardim”

O pecado atingiu o homem em seu relacionamento com a esposa. Gn 3.12:
- “Então, disse o homem: A mulher que me deste por esposa, ela me deu da árvore, e eu comi.”

O pecado atingiu o homem em seu relacionamento com seu habitat.
- “maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida. Ela produzirá também cardos e abrolhos, e tu comerás a erva do campo. No suor do rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, pois dela foste formado; porque tu és pó e ao pó tornarás.” Gn 3.17

O pecado atingiu tantas outras coisas, inclusive partes constitutivas do homem como sua biologia (dores de parto para mulher, suor para o trabalho...), que os reformadores cunharam a expressão “Totalmente depravado” significando que o homem foi atingido na totalidade de seu ser (não intensamente depravado, pois aí significaria a perda completa da imagem de Deus, mas extensamente depravado, pois não ficou área alguma de seu ser que não fosse atingido pelo pecado.

Entretanto, isso não o exime de cumprir as funções para as quais Deus o fez. Ele perdeu o privilégio de cuidar do “jardim de Deus”, mas ainda tem a obrigação de cuidar da “criação de Deus”, como Deus quer que ela seja cuidada.

Deus cobrará seu desleixo. Começará por seu relacionamento com ele, e não deixará de fora seu relacionamento com o próximo (a partir de sua esposa), nem com o meio-ambiente.


3. Só o Remido pode exercer corretamente a mordomia
Você se lembra de que todos os mandatos dependiam do mandato espiritual? Este é o primeiro a ser recuperado em Cristo.

Redimido, o homem é chamado a relacionar-se com Deus. Sua velha natureza (a carne), o mundo e o mais interessado em que ele fique longe de Deus o atrapalham a tal ponto que ele, na maioria das vezes, perde o rumo.

Apesar de ter acesso ao Criador, e poder cuidar novamente do “jardim de Deus” ele dá mais ouvidos às sandices de seus 3 inimigos, do que a Palavra do próprio Deus e resolve fazer as coisas como ele “acha” que devem ser feitas.

Entretanto ele é o único para quem a Palavra de Deus faz sentido, e o único que pode aplicá-la, e o único de quem o Criador (agora Redentor), aceitará serviço.

Somente ele sabe que tudo o que possui não é seu. Somente ele sabe que, mais do que nunca a criação de Deus precisa de cuidados.

Somente ele sabe que Deus continua demandando dele esta missão.


Conclusão
Os que possuem a “mente de Cristo” sabem quais são as prioridades de Deus e o modo como Deus quer que seu “jardim” seja cuidado. Não caberia neste papel a quantidade de textos que mostram essas prioridades. Mas como é necessário selecionar, creio que estes mostrarão bem e as próximas 3 lições procurarão deixar bem claro o que e como podemos e devemos fazer.

Coração voluntário - “2Co 8.3 Porque eles, testemunho eu, na medida de suas posses e mesmo acima delas, se mostraram voluntários, 4 pedindo-nos, com muitos rogos, a graça de participarem da assistência aos santos. 5 E não somente fizeram como nós esperávamos, mas também deram-se a si mesmos primeiro ao Senhor, depois a nós, pela vontade de Deus”

Responsabilidade - “Tg 2.15 Se um irmão ou uma irmã estiverem carecidos de roupa e necessitados do alimento cotidiano, 16 e qualquer dentre vós lhes disser: Ide em paz, aquecei-vos e fartai-vos, sem, contudo, lhes dar o necessário para o corpo, qual é o proveito disso? 17 Assim, também a fé, se não tiver obras, por si só está morta.”

Na presença de Deus - “2Co 9.6 E isto afirmo: aquele que semeia pouco pouco também ceifará; e o que semeia com fartura com abundância também ceifará. 7 Cada um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por necessidade; porque Deus ama a quem dá com alegria. 8 Deus pode fazer-vos abundar em toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência, superabundeis em toda boa obra, 9 como está escrito: Distribuiu, deu aos pobres, a sua justiça permanece para sempre.